quinta-feira, 21 de outubro de 2010

OUTONO

Da janela do meu quarto, onde escorrem gotas de chuva miudinha e teimosa,assisto á queda das folhas amareladas dos carvalhos rugosos e envelhecidos,empurradas para o vôo ondulado de despedida,pelo vento frio de leste que as arrancou dos galhos ressequidos.Ao longe,na montanha mais cinzenta,um timido raio de sol tenta romper o tecto de nuvens pesadas,procurando manter o arco-íris que domina o vale ainda sonolento.Os pássaros abrigados nos beirais,vão piando sem força para cantar,resmungando pela sorte que os espera,ansiando o regresso da primavera!Os arbustos, tambem eles desfolhados,enchem-se de gotas de água que escorrem para o solo,formando riachos de caudal cada vez maior,que arrastam a poeira de um verão já distante e as folhas mortas e apodrecidas.Chegou o Outono!Apesar do célebre buraco de ozono,o ciclo da natureza renova-se todos os anos,fiel ao principio das quatro estações e ás suas caracteristicas singulares.Esta é uma estação equilibrada,cheia de tons quentes e dias mornos,de folhas caducas e árvores que se despem despudoradamente.Prenúncio de um inverno que se aproxima,é tambem a época ideal para recuperar energias consumidas ao desbarato, em verões escaldantes,carregados de suores e abusos de toda a espécie!Paira no ar alguma tristeza,enche-se a alma de melancolia e o espírito inunda-se de poesia.Ouvem-se sonetos por todo o lado,pintam-se quadros de tons suaves,sente-se o cheiro de terra molhada,as noites são mais longas e escuras,os dias mais curtos e mesclados.Retiram-se as lãs da naftalina,assam-se castanhas em potes de barro,mata-se o porco já bem tratado,guarda-se a carne na salgadeira e fuma-se o chouriço a morcela e até a alheira!Depois tudo vai perdendo alguma graça á medida que se aproxima o Inverno sorrateiro,restando a esperança, que é certeza, que para o ano haverá novo Outono, por ordem expressa da natureza.Pois é, a vida tambem tem o seu ciclo de estações que se esgotam em rápida sequencia e que infelizmente não se renovam!A maior parte das vezes o Outono chega sem que tenhamos vivido em pleno a Primavera,sem que tenhamos investido sériamente no Verão.Só quando o frio enruga a pele e a chuva desgasta os ossos,começamos a ter a noção da proximidade do Inverno, não desejado,mas sem qualquer hipótese de rejeição!Estou nessa fase e confesso o meu desagrado e a minha surpresa.Cheguei quase sem dar por ela,mas agora que tenho a noção exacta do pouco tempo que resta,apetece-me viver intensamente,minuto a minuto,se possível dispensando o sono,para ter hipótese de voltar aos caminhos da minha aldeia, sentir o cheiro da lenha queimada na lareira,ver o fumo branco a sair das chaminés,sentir o ondular das searas,ouvir o murmúrio dos choupos e pinheiros e correr nos campos carregados de girassóis!Quero o velho cuco a cantar,as margaridas a crescer e as amendoeiras em flôr!Quero ouvir as badaladas do sino de bronze da minha igreja e o apito do combóio no apeadeiro!Já agora ,que a água do mar me venha molhar os pés,o marulhar das ondas me encha os ouvidos e que o luar de Agosto me ilumine o caminho que ainda me espera!É utopia?Será pedir muito?Eu depois prometo contar...

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